Reflorestar áreas desmatadas é uma ferramenta importante para reverter os impactos da destruição ambiental e, além de contribuir com a recuperação da natureza, a estratégia tem efeitos econômicos e sociais relevantes.
É o que mostra um novo estudo do Instituto Escolhas, organização que desenvolve pesquisas e análises sobre temas ligados ao desenvolvimento sustentável, que apontou que a recuperação de florestas em pequenas propriedades pode produzir 156 milhões de toneladas de alimentos e gerar 260 bilhões de reais em receita líquida.
Além disso, o levantamento indicou que a recuperação de 1,02 milhão de hectares de área desmatada – o equivalente a cerca de um milhão de campos de futebol – pode ajudar a retirar quase 490 milhões de toneladas de gás carbônico da atmosfera. A pesquisa leva em conta a meta assumida pelo Brasil no Acordo de Paris, firmado em 2015, que estipula objetivos a serem alcançados até o ano de 2030.
Em um novo recorte da pesquisa, a organização apontou para o potencial presente na recuperação de Áreas de Preservação Permanente (APPs) desmatadas e localizadas especificamente em pequenas propriedades.
Nesse caso, de acordo com o levantamento, uma alternativa interessante é a implementação de Sistemas Agroflorestais (SAFs), uma vez que estes se baseiam em culturas agrícolas de ciclo rápido e permitiriam o retorno do investimento em curto prazo. Ao mesmo tempo, os SAFs garantem renda a longo prazo, porque envolvem o cultivo de espécies perenes e até mesmo de animais.
Levando em conta os modelos de SAF propostos pelo levantamento, alimentos como jabuticaba, erva-mate e palmito poderiam superar em mais de 100% sua produção atual no país.
A produtividade total desses sistemas representaria 5,2 milhões de toneladas de alimentos a mais sendo entregues anualmente à população brasileira. Para tanto, seria necessário o investimento de 33,1 bilhões de reais para a implementação dos modelos cogitados. Por outro lado, os ganhos equivaleriam a até oito vezes esse montante.
Tendência global
Outras pesquisas corroboram os achados do Instituto Escolhas. Um novo estudo publicado na revista científica Nature revelou que o desmatamento e as florestas degradadas em decorrência das mudanças ambientais estão superando as taxas atuais de recuperação florestal.
Contudo, a recuperação de florestas tropicais após a ocorrência de distúrbios pode compensar em até um quarto as emissões de carbono de novos incidentes de desmatamento e destruição.
Florestas ajudam a regular o clima ao absorver energia solar e devolvê-la à atmosfera, o que gera equilíbrio à temperatura do planeta. Uma floresta tropical armazena, em média, 200 toneladas de carbono por hectare, o que equivale a cerca de 40 carros em circulação.
Um relatório recente da Rede WWF mostrou que o planeta está falhando na proteção das florestas. Só no ano passado, foram 4,1 milhões de hectares de floresta tropical perdidos.
Outros estudos destacam que as perdas atuais significam que o mundo está 21% abaixo do esperado em relação à meta de acabar com o desmatamento até 2030. O documento salienta que apenas 2,2 bilhões de dólares em recursos públicos são canalizados às florestas anualmente – valor muito menor do que aquele aplicado em outros investimentos.
O progresso, ainda que certeiro, é lento. “A pesquisa recém-lançada representa a segunda vez em que o Instituto Escolhas calcula o investimento necessário para o cumprimento da meta brasileira estabelecida no Acordo de Paris, em 2015. De lá para cá, apenas 79,1 mil hectares foram recuperados. Isso é menos de 1% da meta original”, disse a gerente de Projetos do Instituto Escolhas, Patricia Pinheiro.
“É necessário que vários setores da sociedade se mobilizem, tanto públicos quanto privados. Proprietários de terras e empresas que tenham áreas desmatadas em Reserva Legal e Área de Preservação Permanente devem fazer a regularização ambiental dessas áreas de proteção dos imóveis rurais”, completou.
Para o coordenador de políticas de governança fundiária e desenvolvimento na Secretaria de Governança Fundiária e Desenvolvimento Territorial e Socioambiental, Moisés Savian, “desde o novo Código Florestal, as condições foram criadas para avançar no reflorestamento. A agenda ambiental e climática teve uma descontinuidade no governo Bolsonaro, mas está se reabrindo agora. O potencial de fortalecimento agora é bastante significativo com a recuperação de reservas legais, por exemplo”, disse.
“O poder público tem o papel de liderar a recuperação dessas áreas no Brasil, especialmente por meio de projetos de fomento. Temos um grande desafio pela frente, e ele exige muitos recursos”, completou.
A participação do setor privado
Além de investimentos e programas públicos, o setor privado pode assumir um papel de protagonismo na restauração florestal. É o que defende a empresa PlantVerd, fornecedora de serviços que transforma ecossistemas.
“A recuperação de florestas é a principal ferramenta pela qual a nossa sociedade vai construir um meio resiliente para o enfrentamento das crises hídricas, queimadas, desastres causados pela ação humana, entre outros. Desta forma a floresta não pode ser vista como algo intocável, mas como uma ferramenta que nos ajuda a construir uma comunidade mais resiliente”, opinou o CEO da PlantVerd. Antonio Borges.
“Todos somos necessários na reconstrução da sociedade e do meio ambiente. Deixar apenas nas mãos de uma única vertente não é a solução. No entanto, as empresas devem assumir cada vez mais um papel de aliadas nas transformações ambientais, adotando para si a agenda verde e investindo no impacto ambiental e social das comunidades nas quais estão presentes”, concluiu.
Em certa escala, os efeitos da recuperação de matas já podem ser sentidos. No mercado, surgem cada vez mais itens produzidos em áreas em reflorestamento. Em alguns locais, como na propriedade da família do fotógrafo Sebastião Salgado, no Vale do Rio Doce, há relatos de animais retornando ao seu habitat natural na mata após a aplicação de esforços de recuperação de regiões degradadas.
No Pampa brasileiro, Mirian Costa é dona de um SAF de dois hectares e produz frutas nativas da região para a agroindústria. “A importância dessa recuperação é clara: a fauna e a flora voltam a se desenvolver nessas áreas quando trabalhamos para o reflorestamento”, contou Mirian. Para o CEO da PlantVerd, investir nessa agenda é uma questão de prevenção para o futuro. “Não estamos mais trabalhando para evitar os impactos causados pela crise climática, estamos buscando formas de nos tornar mais resilientes para as intempéries que virão.”