15.04.2024

Promover a equidade é essencial na transição para economia de baixo carbono, mostra pesquisa

Documento do BCG aponta necessidade de combater desigualdades sociais no desenvolvimento de estratégias climáticas
Foto: Appolinary Kalashnikova/ Unsplash
Turbina eólica cercada por grama

A necessidade de adaptação à mudança do clima interfere, também, no mundo do trabalho. De acordo com um levantamento do LinkedIn, entre 2022 e 2023, a publicação de vagas que demandavam ao menos uma habilidade verde cresceu cerca de 22,4%. Ao mesmo tempo, a quantidade de perfis com o conhecimento necessário para lidar com questões climáticas aumentou em 12,3%, uma diferença significativa entre oferta e demanda. A transição econômica trouxe diversas oportunidades, mas é preciso que elas sejam impulsionadas com equidade para garantir que todas as pessoas tenham acesso aos mesmos benefícios.  

De acordo com levantamentos realizados pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), até o ano de 2030, a atual transformação climática pela qual passamos implicará a criação de aproximadamente 103 milhões de novos empregos, muito embora resultará na demissão de 78 milhões de trabalhadores. 

Pensando nisso, uma nova análise do Boston Consulting Group (BCG) indicou que, conforme avançamos em direção a uma economia mais sustentável, é cada vez mais necessário tomar ações socioeconômicas para garantir a equidade de oportunidades nesse novo contexto mundial.

Assim, em parceria com o Fórum Econômico Mundial, o BCG desenvolveu estratégias para identificar e pontuar os custos e benefícios desse cenário para trabalhadores, consumidores e empreendedores. 

“Nosso objetivo é contribuir com um caminho para a equidade que garanta o acesso de todos aos benefícios de uma economia de baixo carbono, considerando também o impacto de custos para o público em geral”, afirma o diretor executivo e sócio do BCG, Arthur Ramos. Consequentemente, os levantamentos do BCG sugerem a necessidade de se colocar a equidade no centro dos esforços climáticos.

Justiça climática

Para o advogado trabalhista e de direitos humanos e sócio do escritório Cezar Britto Advogados Associados, Breno Cavalcante, essa percepção é uma questão histórica. “Assim como em outros países alvos de colonização por exploração, há uma divisão social e racial do trabalho que impõe os trabalhos mais pesados e precários aos negros, indígenas e demais grupos sociais atingidos pela escravização de ontem e de hoje”, disse. 

De acordo com Cavalcante, são os moradores desses territórios marginalizados que ocupam os postos de trabalho mais afetados pela exposição ao calor e à mudança climática, como o corte da cana de açúcar, a construção civil, a venda de mercadorias nas grandes cidades, entre outros.

“Assim, é preciso que a elaboração de políticas públicas leve em conta essas desigualdades e aponte no sentido da sua superação por meio da saúde, da educação, do saneamento básico e do desenvolvimento local,” afirmou.

Em seus relatórios, a consultoria aponta que diversos pontos da transição climática podem impulsionar a desigualdade, a exemplo da redução do uso de combustíveis fósseis e da crescente aposta na geração e consumo de energias renováveis. Por outro lado, o contexto de adaptação climática traz oportunidades. 

Exemplo disso é o fato de que o setor de energia renovável, atualmente em crescimento, enfrenta uma lacuna de habilidades, uma vez que cerca de 36% da força de trabalho para esse mercado requer algum tipo de conhecimento especializado.

“Pelos seus recursos naturais abundantes, o Brasil já é protagonista na transição energética global. O nosso enorme potencial na produção de energéticos de baixo carbono, como biocombustíveis, hidrogênio verde, biogás e energia elétrica renovável, pode significar aumento na geração de empregos, investimentos em infraestrutura e atrair capital produtivo para a região”, indicou Ramos, do BCG.

Futuro verde

Desse modo, abordar essa falta de mão-de-obra pode ter a função dupla de ajudar a atender à demanda por profissionais e minimizar os efeitos socioeconômicos negativos da diminuição do uso de combustíveis fósseis, o que certamente implicará no corte de muitos empregos. De acordo com a Agência Internacional de Energia, existem aproximadamente 32 milhões de pessoas trabalhando atualmente com combustíveis fósseis. 

Para o professor do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e coordenador do Grupo de Economia do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, Carlos Eduardo Young, as ações ligadas à transição climática não vão gerar perdas líquidas de empregos. 

“Essas medidas vão eliminar o favorecimento de atividades e setores altamente beneficiados, como aqueles ligados ao desmatamento, que geram muito pouco valor se comparado ao dano causado”, afirmou.

Ainda, Young destaca como o agronegócio é um dos setores que mais desemprega no Brasil. “Segundo dados do IBGE, a agricultura é responsável pela perda de mais de 3 milhões de ocupações nos últimos 20 anos. O que queremos é uma agricultura menos danosa e muito mais intensiva em mão-de-obra”, explicou.

Para que a mudança seja o mais igualitária possível, é essencial que ela aconteça de forma a privilegiar a criação de empregos verdes. “Há setores que perderão postos devido à mudança climática. No entanto, eles não são tão intensivos no que diz respeito à quantidade de empregos que demandam. Por sua vez, os empregos verdes criados pela necessidade de adaptação exigem muito mais postos de trabalho”, diz Young.

Jornalista formada pela ECA-USP e graduanda em Direito pela PUC-SP

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