15.03.2024

Projeto de lei para adaptação climática pode impulsionar transformações urgentes, dizem especialistas

Após um ano marcado por eventos climáticos extremos, o Brasil pode ocupar posição de destaque no âmbito internacional
Foto: Li-An Lim / Unsplash
Pessoa segurando cartaz não há planeta B

Na última quarta-feira de fevereiro, a Comissão de Meio Ambiente do Senado Federal aprovou uma proposta que traz diretrizes e critérios para a formulação e implementação dos planos nacional, estadual e municipal de adaptação à mudança climática. Assim, o projeto de lei 4.129/2021, se aprovado pelo plenário, voltará à Câmara para análise.

No texto, constam incentivos que promoveriam uma espécie de transição voluntária, dando espaço para que produtores se adaptem gradualmente, “minimizando riscos e maximizando a eficiência operacional”, conforme é apresentado na emenda.

A contínua escalada da temperatura global, que atingiu seu pico em 2023, trouxe à tona grandes discussões acerca da adaptação climática, com o aumento da frequência de eventos climáticos extremos no planeta: só no Brasil, foram 1.161 registrados, o maior número já catalogado pelo Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden).

De forma geral, adaptação climática se trata da capacidade de um território ou sistema reduzir sua vulnerabilidade frente às mudanças climáticas. Nesse sentido, o projeto de lei 4.129/2021 vem com diretrizes a serem seguidas pelos órgãos do Sistema Nacional de Meio Ambiente para complementar a lei 12.187/2009, que estabeleceu a Política Nacional sobre Mudança do Clima.

Assim, as diretrizes do plano incluem o enfrentamento dos efeitos das alterações climáticas, a criação de instrumentos que permitam a adaptação dos sistemas naturais, humanos, produtivos e de infraestrutura e a integração entre estratégias locais, regionais e nacionais de redução de danos e ajuste às mudanças, segundo a Agência Senado. 

Além disso, a proposta torna obrigatório o alinhamento dessas estratégias ao Acordo de Paris, firmado em 2015. Ainda no PL está prevista a adequação do setor agropecuário, incluindo estímulos a investimentos em pesquisa e a implementação de práticas e tecnologias ambientalmente adequadas, de acordo com a mesma fonte.

De forma geral, o projeto de lei trará normas para a elaboração ou revisão dos planos de adaptação nacional, estaduais e municipais, indicando a priorização de áreas com populações mais vulneráveis, eleitas a partir de critérios de etnia, raça, gênero e condição de deficiência. Ademais, o PL 4.219/2021 viabiliza o acesso ao Fundo Nacional de Mudança Climática com vistas ao financiamento da criação e implementação de ações dos planos de adaptação, entre outras possibilidades hoje não previstas em lei federal.

De acordo com o coordenador de política socioambiental do Instituto Democracia e Sustentabilidade (IDS), Marcos Woortmann, o PL institui a obrigatoriedade de planejamentos em relação à mudança climática. “Isso mudará a realidade de milhares de municípios brasileiros, que não poderão mais esconder o sol com a peneira. A sociedade civil poderá cobrar que essas alterações sejam realizadas e incrementadas”, disse.

Um relatório global publicado no final de 2023 pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) trouxe alertas ligados ao fato de que o progresso mundial em direção à adaptação climática está desacelerando, justamente quando deveria estar ganhando força. 

O documento indicou que os fundos exigidos para a adaptação aos efeitos da mudança climática deveriam chegar à faixa dos 215 a 387 bilhões de dólares por ano nesta década. No entanto, os recursos atualmente investidos para esse fim são de dez a 18 vezes menores do que isso nos países em desenvolvimento.

De fato, a situação é bastante complicada. Os últimos anos têm trazido obstáculos cada vez maiores, os quais devem ser superados para que se possa garantir o bem-estar da população. É o que aponta o analista sênior de políticas de clima no Instituto Socioambiental (ISA), Ciro Brito. “Não temos ido muito bem em termos de adaptação climática. Pelo contrário: 2023 foi o ano em que a Amazônia secou; o ano em que enfrentamos a pior estiagem da história, acompanhada por queimadas ilegais e por uma seca extrema impulsionada pelo El Niño”, afirmou, 

“Por isso, é crucial elaborar planos de adaptação climática e acelerar suas implementações, dada essa rápida intensificação dos eventos climáticos extremos. Em todo mundo, as cidades estão adotando planos semelhantes para enfrentar os desafios da emergência climática,” completou o analista do ISA.

Ainda que haja lugar para melhorias, o Brasil se encontra em uma posição de destaque no contexto de adaptação climática. Para o diretor jurídico nacional de mudança climática, de direito dos animais e assuntos internacionais da Associação Nacional de Municípios e Meio Ambiente (Anamma), Marcelo Marcondes, ainda há muito espaço para avanços. “Entretanto, somos um dos poucos países com grande organização da estrutura ambiental e com vasta legislação, o que nos mantém à frente para gerar bons resultados para o Brasil e para o planeta”, disse.

Nota-se, pois, que ainda há muito em que avançar. No entanto, a aprovação de projetos de lei como o PL 4.219/2021 pode funcionar como um impulso à criação de mais políticas que tratem de adaptação climática – assunto inevitável quando se fala no futuro próximo. Nesse sentido, o Brasil pode se encontrar em uma posição de especial peso no cenário internacional para fazer a mudança acontecer de verdade.

Jornalista formada pela ECA-USP e graduanda em Direito pela PUC-SP

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