Em janeiro deste ano, o Fórum Econômico Mundial divulgou o Relatório de Riscos Globais de 2024. No curto prazo, a desinformação e eventos climáticos extremos ocupam o topo do ranking, em primeiro e segundo lugar, respectivamente. No longo prazo, considerado daqui a dez anos, questões ambientais ocupam as quatro primeiras posições da lista de riscos: eventos climáticos extremos, mudanças críticas aos sistemas da Terra, perda de biodiversidade e colapso dos ecossistemas e escassez de recursos naturais.
Embora os assuntos não estejam diretamente conectados no relatório, a disseminação de informações falsas sobre a crise do clima é um dos grandes desafios para enfrentar a emergência climática com a seriedade necessária para frear o aquecimento global. Por trás das mentiras ambientais estão interesses diversos, desde o lobby de indústrias poderosas, como as petroleiras, até a perspectiva de melhores condições climáticas para alguns países, como a Rússia, em um planeta mais quente.
Por exemplo, em 2019, o governo russo aprovou o Plano de Adaptação Nacional. O documentou apresentou uma série de medidas para lidar com os impactos climáticos e citou os efeitos positivos da mudança do clima: “reduzir o consumo de energia durante a estação de aquecimento, melhorar as condições de transporte de mercadorias nos mares do Ártico e aumentar a eficiência da pecuária”.
A influência de um país como a Rússia, que tem Vladimir Putin no poder há 23 anos, pode mudar, ou dificultar, o caminho para a adoção de tratados internacionais. De acordo com um relatório de 2023 da organização Climate Action Against Disinformation (CAAD), contas oficiais da Rússia em redes sociais tiveram o papel de agentes do caos no debate climático. As contas não tiveram mensagens consistentes sobre ciência, ação ou fornecimento de energia, mas usaram esses assuntos para influenciar campanhas cujo foco eram países ocidentais e o Sul Global.
O tom de cada publicação mudou de acordo com o alvo em questão: investimentos em combustíveis fósseis na África foram criticados como tentativas de roubar os recursos do continente quando ligados a países ocidentais, mas tratados como a melhor opção para o desenvolvimento econômico na Rússia.
A demora para adotar medidas necessárias gera impactos nas regiões mais vulneráveis, como o Ártico e a Antártica. Em um estudo publicado em 2022, cientistas mostraram que o Ártico aqueceu quase quatro vezes mais do que o restante do planeta desde 1979. Ao mesmo tempo, uma pesquisa divulgada em 2023 mostrou que a Antártica está aquecendo duas vezes mais rápido em comparação com outras regiões do globo. Mesmo com diversas evidências sobre o impacto da crise climática nos polos, ambos costumam ser alvo de desinformação.
Veja, a seguir, algumas fake news sobre o Ártico e a Antártica:
1. Mar do Ártico:
O gelo do Mar do Ártico é monitorado por satélite desde 1979. De acordo com NASA, a agência espacial norte-americana, a extensão registrada em setembro vem diminuindo 12,2% por década, comparado com a extensão média registrada no período entre 1981 a 2010. Contudo, um grupo do Reino Unido de negacionistas climáticos divulgou informações falsas sobre o aumento da extensão de gelo. Ao invés de mostrar toda a série histórica, o grupo fez um recorte de 2007 a 2021, quando o declínio foi mais lento.
A compreensão sobre a realidade do Ártico é especialmente importante porque o derretimento do gelo abrirá uma nova rota de navegação, previsão que já estimulou a militarização dos países que compartilham o território.
2. Derretimento de gelo e de geleiras na Antártica:
De acordo com o glaciologista e vice-presidente do Comitê Científico sobre Pesquisa Antártica (SCAR), Jefferson Cardia Simões, o gelo do mar da Antártica e o gelo das geleiras estão derretendo, mas a característica de cada um é diferente – há uma confusão proposital para dar a entender que é tudo a mesma coisa. Enquanto o mar congelado responde de forma mais rápida, as geleiras reagem de maneira mais lenta ao aquecimento global. Os dois estão perdendo volume e extensão, mas notícias sobre o derretimento de geleiras passam a falsa percepção de contribuição catastrófica com o aumento do nível do mar como se fosse um efeito quase imediato, no mesmo ritmo do gelo do mar.
3. Geleiras do mundo:
Estudos comprovam que as geleiras estão encolhendo – no entanto, fake news que ganham espaço em sites e blogs espalham que elas estão crescendo. De acordo o World Glacier Monitoring Service (WGMS), que acumula dados de 228 geleiras desde 1946, há grupos de geleiras consideradas como “de referência” por terem medições de forma contínua. Em um relatório de 2011, o WGMS mediu 136 estruturas de gelo da Antártica ao Canadá e da Bolívia ao Japão. O WGMS chegou à conclusão que cerca de 90% delas estão recuando. Essa fake news foi checada pelo Fakebook.eco em 2020.