20.05.2024

A onda de branqueamento que atinge corais em diferentes regiões do planeta

Especialistas afirmam que crise pode ter impactos econômicos e na saúde das pessoas
Foto: Hiroko Yoshii/ Unsplash
Cardume de peixes no corpo de água
Recifes de corais abrigam cerca de 25% da biodiversidade marinha

O Brasil – e diversos países costeiros – passou por aquele que pode ser o branqueamento de corais mais intenso de sua história. Informações compiladas pelo Coral Reef Watch, da Administração Nacional Oceânica e Atmosférica dos Estados Unidos (NOAA) indicam que seis das sete áreas de recifes brasileiros monitorados estão com algum tipo de alerta de branqueamento.

De acordo com um relatório publicado pela NOAA, ao menos 53 países, economias locais e territórios sofreram com o branqueamento de corais no ano passado. É a segunda onda do tipo registrada no período de dez anos e, em 2024, o planeta enfrentará a quarta grande onda de branqueamento, a qual deve atingir todo o Hemisfério Sul, inclusive o Brasil.

De forma geral, o branqueamento acontece quando a água dos mares tem um aquecimento anormal com certa frequência, fazendo com que algas que vivem em simbiose com os corais sejam expelidas. Essas algas são responsáveis pela coloração e alimentação das colônias de corais. Sem elas, os recifes se tornam muito mais frágeis e suscetíveis à morte. 

No Brasil, foram avistados incidentes de branqueamento em regiões de Pernambuco, Alagoas e Bahia. Diversos corais foram afetados na Área de Proteção Ambiental (APA) Costa dos Corais, localizada entre os municípios de Tamandaré e Maceió. 

Em abril, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) lançou um edital para projetos de proteção a recifes de corais no Brasil. O objetivo é liberar até 60 milhões de reais para os programas, com a priorização de projetos que melhorem a qualidade das águas e combatam a pesca predatória, entre outros. 

O foco será em uma área que vai do norte do Espírito Santo ao Maranhão, sobretudo no Parque Estadual do Parcel do Manuel Lins, um grande recife que pode receber interferências da exploração de petróleo na área. Trata-se de uma tentativa de reverter ou, ao menos, mitigar a situação.

Importância sistêmica

Os corais servem como abrigo para reprodução e alimentação de inúmeras espécies de moluscos e crustáceos. Além disso, neles estão cerca de 65% dos peixes marinhos. Assim, quando um recife de corais deixa de existir, perde-se também toda a biodiversidade que ele envolve. 

Além de prejudicar o meio ambiente por si só, o branqueamento de corais tem efeitos negativos sobre a fonte de renda de comunidades litorâneas e sobre a segurança alimentar, por exemplo.

 “Por abrigar tanta biodiversidade, o recife de coral fornece muito alimento ao homem, como pescados. Cerca de 10% de toda a proteína animal consumida no planeta vem do coral”, explica o professor doutor do Instituto de Oceanografia da Universidade de São Paulo (USP) e vice-presidente do Instituto Coral Vivo, Miguel Mies. 

“Ainda, por ter uma beleza natural, o recife estimula a indústria do turismo, formando um comércio em volta deles. Cerca de 10 trilhões de dólares em renda são gerados pelos corais”, completou. 

Segundo a ONG WWF, 850 milhões de pessoas dependem dos corais para alimentação, trabalho e proteção contra temporais e erosões.

Ameaça global

Com o aquecimento global e a consequente recorrência de ondas de calor marinhas, os eventos de branqueamento de corais tornam-se mais frequentes e mais graves. 

Medições não deixam dúvidas: com exceção de uma porção do Pacífico Sul, todos os oceanos estão mais quentes, sendo que o Atlântico, que banha o Brasil, e o Índico têm se aquecido mais intensamente. No ano passado, o aquecimento das águas dos mares foi recorde.

A questão dos corais é especialmente sensível no nosso país. “O Brasil, principalmente o Nordeste, possui uma dívida histórica com os recifes de corais. Todas as cidades de colônia costeiras foram construídas utilizando os recifes, que eram a base da cal da argamassa”, afirma o pesquisador de ecologia de recifes de corais e professor do departamento de oceanografia do Instituto de Geociências da Universidade Federal da Bahia (UFBA), Igor Cruz.

Mas nem tudo está perdido. “Podemos agir localmente para minimizar os impactos do branqueamento. Remover impactos locais, como poluição, turismo e pesca predatória, entre outros, deve ajudar. Além disso, em casos de boas condições ambientais, podemos acelerar a recuperação do recife com a restauração.” Ainda de acordo com o especialista, os corais se recuperam. Contudo, isso depende do tempo que passaram branqueados e da espécie de coral.

Assim, ainda há o que pode ser feito para diminuir os efeitos negativos do branqueamento. No entanto, a situação pela qual passamos é bastante crítica e deve ser tratada com cuidado. O culpado, como em muitos outros casos, é o aquecimento global intensificado por ações humanas.

“Esses eventos são um indicativo dos efeitos das mudanças climáticas e trazem um alerta importante: o tempo de ação para as revertermos está acabando”, afirma a professora titular do departamento de oceanografia da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Beatrice Padovani. “A morte dos corais é apenas um dos muitos problemas que esse novo cenário pode trazer para a humanidade.”

Jornalista formada pela ECA-USP e graduanda em Direito pela PUC-SP

Gostou das histórias que você viu por aqui?

Inscreva-se para ficar sempre em dia com o melhor do nosso conteúdo.

Mais histórias em

Foto: Liliane Lodi/ Divulgação
A baleia-jubarte realiza longas migrações anuais entre locais de reprodução e áreas de alimentação
Foto: Jan Meeus/ Unsplash
Entre 70% e 90% das espécies de árvores em florestas tropicais dependem da dispersão de sementes realizada por animais, diz pesquisa
Foto: NASA
Em 2024, a poluição plástica é o tema de destaque para despertar a conscientização da sociedade