Engana-se quem pensa que a Amazônia é o pulmão do mundo. A realidade é que mais de 50% do oxigênio produzido na Terra vem dos oceanos. Responsável por absorver parte dos gases de efeito estufa que entram na atmosfera, o maior ecossistema do planeta desempenha um importante papel na regulação do clima, além de ser o habitat natural de mais de 260.000 espécies conhecidas.
Ainda assim, cerca de 11 milhões de toneladas de plástico entram nos oceanos anualmente, de acordo com uma estimativa do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma). A quantidade equivale a um caminhão de lixo sendo despejado a cada minuto. Enquanto isso, um terço desses resíduos são provenientes apenas do Brasil.
Para o professor do Instituto Oceanográfico da USP e coordenador da Cátedra Unesco para a Sustentabilidade do Oceano, Alexander Turra, a falta de cuidado com o oceano é um problema histórico e cultural. “Desde o começo da colonização e até depois com os bandeirantes, a ideia era ver o que o país tinha de riqueza no continente. A própria relação com o mar, historicamente construída no mundo, é tardia no Brasil”, aponta.
Apesar de existir uma preocupação com a poluição por plásticos, os ambientes marinhos sofrem também com o impacto de despejo de rejeitos de mineração, derramamento de petróleo e pelo lançamento de esgoto sem tratamento. No Brasil, uma série de episódios de crimes ambientais marcaram a história do país.
Em 2015, a barragem da mineradora Samarco se rompeu em Mariana e resultou no despejo de 50 milhões de metros cúbicos de rejeitos de minério de ferro na bacia do rio Doce. Outro exemplo marcante foi a mancha de óleo que afetou boa parte do litoral brasileiro em 2019 e teve impactos em todo o ecossistema marinho.
Com menos de uma década para mudar o rumo dos desafios ambientais, iniciativas de educação oceânica – também conhecidas como cultura oceânica – podem ser a resposta para reverter essa realidade. A Organização das Nações Unidas (ONU) declarou a ‘Década da Ciência Oceânica para o Desenvolvimento Sustentável’ entre os anos de 2021 e 2030, com o objetivo de reforçar a importância dos oceanos e mobilizar a sociedade civil em prol do uso sustentável do ambiente marinho.
“A gente precisa fazer com que outras pessoas tenham essa conexão de tomar um banho de mar, pular onda no final do ano, surfar, mergulhar, navegar e se inspirar”, afirma Turra. No entanto, segundo ele, o maior desafio da educação oceânica é democratizar esse tipo de relação com o ambiente marinho.
“Isso vai acontecer na medida em que a gente conseguir distribuir mais renda na sociedade. Conforme as pessoas têm mais condições de se deslocarem de seus locais de moradia, elas passam a ter a oportunidade de conhecer o mar e sentir isso tudo que quem já teve a oportunidade sente.”
Entre as iniciativas de aproximar as pessoas dos oceanos, uma que se destaca é a expedição Voz dos Oceanos da Família Schurmann. Os primeiros brasileiros a darem a volta ao mundo de veleiro presenciaram os oceanos se transformarem em depósitos de lixo.
A matriarca da família, Heloisa Schurmann, experiente velejadora e vice-presidente da empresa, acompanhou o aumento da poluição nos mares. “Ao norte da Austrália, em 2015, nós desembarcamos em uma ilha deserta e isolada, a West Fayu. Ao invés de encontrarmos praias paradisíacas, típicas daquela região, encontramos cem metros de praia totalmente cobertas de plástico, lixo, garrafas pets, sandálias e todos os tipos de embalagens”, disse.
Incomodados com a situação, resolveram recolher todos os resíduos distribuídos pela praia e levá-los para o seu veleiro. Ao total, foram recolhidos dez sacos de 100 litros de garrafa pet.
“Depois da segunda volta ao mundo, transformamos as expedições em um instrumento de educação ambiental e educação oceânica. Fizemos palestras e apresentações de educação ambiental. Além disso, temos parcerias com as escolas”, relatou.
Heloisa também faz algumas recomendações para reduzir o impacto no meio ambiente. “O cuidado com o planeta é como se você estivesse cuidando da sua casa. A primeira regra é repensar as atitudes.” Dentre elas, evitar comprar alimentos embalados em plástico, usar sacolas retornáveis, reaproveitar materiais que sobram dos alimentos e reciclar o óleo de cozinha na pia, que pode virar sabão.
Ao mesmo tempo em que conscientizar é um primeiro passo para reverter a situação, criar leis é a medida eficaz para garantir direitos e promover mudanças estruturais. O Projeto de Lei 2524/2022 busca reduzir a quantidade de plástico gerado pelas indústrias e promover a economia circular do material por meio da reutilização e reciclagem.
De acordo com Turra, a legislação brasileira é bem estruturada e dá conta de boa parte desses problemas envolvendo a destinação final do lixo. Porém, ele ressalta que “o problema é a implementação, a fiscalização, a conscientização” das leis existentes.
Além de políticas públicas, campanhas que mobilizam diferentes países promovem uma visibilidade ainda maior para o tema. O projeto Marés Limpas, da ONU Meio Ambiente, veio para o Brasil em 2017 com o objetivo de reduzir os impactos dos plásticos descartados nos oceanos.
Até agora, 45 toneladas de lixo foram recolhidas das praias e foram feitas 850 palestras de conservação ambiental. Ele conta com 63 países signatários, dentre eles o Brasil. Este é o maior acordo mundial dedicado a acabar com a poluição de plásticos nos oceanos.
Contudo, sem mudanças políticas e iniciativas de conscientização, o volume de plástico que entra no mar quase triplicará até 2040, com uma quantidade anual que atingirá a média de 23 a 37 milhões de toneladas. Por isso, é importante que a educação ambiental seja implementada gradualmente nas escolas e em empresas para que haja uma conscientização da destinação final desse lixo gerado e para que a população entenda os benefícios de ter os oceanos limpos.