01.12.2023

Ondas de calor antes do verão acendem alerta para adaptação a temperaturas extremas

Medidas de prevenção podem ser implementadas para reduzir os efeitos nocivos das temperaturas extremas
Foto: Pixabay
Céu alaranjado com sol reluzente

Ao longo de 2023, o Brasil passou por quatro diferentes ondas de calor, sendo que uma das mais intensas foi em novembro, antes do início do verão. Esta foi excepcional por sua abrangência, intensidade e duração, ela atingiu as cinco regiões do país e levou o Instituto Nacional de Metereologia (Inmet) a decretar alerta vermelho para quinze estados e o Distrito Federal. 

Algumas cidades chegaram a registrar temperaturas entre 10°C e 15°C acima do normal para a época. No Sudeste, o município de Araçuaí (MG) teve a maior temperatura já registrada no Brasil desde 1910, quando o Inmet iniciou as medições oficiais, batendo os 44,8°C.

Ondas de calor tendem a ter efeitos bastante específicos em cada região do planeta e do país. No Sudeste e no Centro-Oeste, por exemplo, o ar ficou extremamente seco, com pouquíssima nebulosidade e um Sol muito intenso, sendo que a umidade relativa do ar despencou. 

Como consequência, a ocorrência de queimadas aumentou bastante, agravando ainda mais a poluição. No Sul, a onda de calor ficou restrita ao centro-norte do Paraná, uma vez que o restante da região estava com acumulados de chuva e enchentes. Por isso, o ar não ficou tão seco. Na região Norte, Manaus enfrentou a pior seca da história, e, no Nordeste, as temperaturas apresentaram-se altas sobretudo na Bahia e no Piauí.

Efeitos desiguais

Mesmo entre cidades grandes, onde poderia se pensar que haveria semelhanças nas formas de passar por ondas de calor, há diferenças notáveis. São Paulo e Rio de Janeiro, duas capitais, mostram as discrepâncias nos territórios. 

De acordo com o membro do Grupo de Estudos Climáticos da Universidade de São Paulo (USP), Eugenio César de Marco Greghi, a diferença se deve justamente pela localização geográfica. “Enquanto São Paulo, uma megalópole, está localizada a cerca de 760 metros de altitude, o Rio De Janeiro é uma cidade litorânea, a cerca de 20 metros de altitude”, explicou. 

“Essa distinção afeta a forma como a população sente o calor. Enquanto a capital paulista vivencia um calor seco e com mais incidência de poluição e queimadas, o Rio de Janeiro enfrenta um calor mais úmido, fato que aumenta a sensação térmica e reduz a poluição do ar.”

Outras cidades do Centro-Oeste e do Sudeste, como Brasília e Belo Horizonte, passam por situações parecidas com a de São Paulo, sem a contribuição da umidade proveniente do mar para aliviar o tempo muito seco e poluído.

Existe também um problema bastante sério de diferença de sensações de calor dentro de uma mesma cidade. “Os bairros mais nobres são mais estruturados para abrigar a população e no enfrentamento do calor, visto que contêm ambientes mais arborizados, conservados, com mais espaços para sombra, ventilação natural, ar-condicionado, parques e áreas de lazer. Em contrapartida, os bairros a população com baixa renda vive, como as comunidades e periferias, carecem de condições para a população enfrentar o calor”, contou Greghi.

 “Muitas residências são pequenas e densamente ocupadas, construídas com materiais que retêm o calor no interior das casas. Frequentemente, os bairros têm pouquíssima cobertura vegetal e arborização, muitos moradores não possuem sequer um ventilador. Então, realmente é um problema bastante agravado pela desigualdade e falta de planejamento urbano.”

Adaptação ao calor

Apesar das dificuldades, há opções para mitigar os efeitos das ondas de calor, muitas das quais passam pelo poder público. De acordo com a professora adjunta de geografia na Universidade Federal do Mato Grosso do Sul e participante da rede de pesquisadores Questões Ambientais Urbanas, Gislene Figueiredo Ortiz Porangaba, intervenções simples podem fazer a diferença na diminuição da temperatura do ar. “Mudar as cores de telhados e paredes para cores claras, aumentar a cobertura vegetal arbórea e rasteira e reduzir as áreas impermeáveis são algumas das possibilidades”, afirmou. 

De acordo com ela, adaptar as cidades aos extremos do clima é uma pauta urgente. “Precisamos fazer um trabalho coletivo entre os vários setores da sociedade e da comunidade científica para reduzir os efeitos do calor e demais eventos extremos, a fim de melhorar a qualidade de vida da população, sobretudo a parcela que se encontra em vulnerabilidade socioambiental”, disse.

Para a meteorologista formada pelo Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da USP, Paola Gimenes Bueno, cabe ao poder público investir em métodos de previsão, prevenção e alerta. 

“Os governos e prefeituras também devem realizar ações para ajudar a população durante essas ondas de calor, criando pontos de atendimento rápido à população, com uma equipe médica, principalmente nas grandes cidades, além de aumentar a disponibilidade de água de forma pública e gratuita”, disse. 

Em relação ao setor privado, cabe às empresas cuidarem do bem-estar de seus funcionários. “Diante das previsões e alertas feitos da chegada de uma nova onda de calor, deve-se aumentar a oferta de água, criar melhores condições de trabalho, principalmente aos que exercem trabalhos físicos e ao ar livre, além de flexibilizar o horário e a forma de trabalho, como incentivar o home office”, afirmou.  

Segundo ela, muitas pessoas acabam passando por algum mal-estar no caminho de ida e volta do trabalho durante os horários de pico nos transportes públicos, principalmente nas grandes cidades, o que pode e deve ser remediado. 

Para Bueno, no futuro, teremos que lidar cada vez mais com eventos como esse. Portanto, a população também deve aprender meios de se precaver e minimizar os riscos à saúde, como manter a hidratação, evitar sair nas horas mais quentes do dia, não se expor diretamente ao Sol e lançar mão de climatizadores e ventiladores.

Segundo a Organização Mundial de Meteorologia (OMM), o fenômeno do El Niño, que pode elevar ainda mais as temperaturas, deve permanecer ativo até abril. Assim, nota-se a importância da adaptação ao aparente novo normal, que envolve temperaturas mais altas, enchentes, alagamentos, chuvas fortes, entre outros fenômenos climáticos. Para tanto, indivíduos, governos e o setor privado devem se unir, em uma tentativa de minimizar os efeitos do calor extremo na saúde humana.

Jornalista formada pela ECA-USP e graduanda em Direito pela PUC-SP

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