Pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) desde o ano de 1979, José Albertino Rafael é editor-sênior do livro “Insetos do Brasil: diversidade e taxonomia” e foi ganhador do prêmio Alexandre Rodrigues Ferreira, concedido pela Sociedade Brasileira de Zoologia, em 2014. É um dos organizadores do Catálogo Taxonômico da Fauna do Brasil, que busca inventariar todas as espécies animais existentes no país.
Rafael realiza expedições com o objetivo de estudar espécies novas ou já conhecidas de insetos pelo Brasil e por outros países. Além disso, publica com frequência artigos científicos e orienta estudantes acadêmicos.
Leia, a seguir, a entrevista com José Albertino Rafael.
Que tipo de trabalho é desenvolvido no Inpa quando o assunto é insetos? A pesquisa que eu desenvolvo é, basicamente, o estudo da nossa fauna de insetos, que é muito extensa. Estudo principalmente moscas silvestres, com as quais o homem não tem muita afinidade. Mas acredito que o homem tenha a obrigação de conhecer a importância de todos os animais com que convive. O ideal, para isso, seria termos milhares de pesquisadores que estudam insetos. Infelizmente, isso não ocorre.
A ciência brasileira conta hoje com uma quantidade satisfatória de cientistas? O número de pesquisadores na minha área está muito aquém do ideal. Por isso, o meu objetivo é contribuir para a defasagem de conhecimento no meu campo. Atualmente, vemos que são gastos bilhões de dólares para buscar vida em outros planetas, mas sequer conhecemos a fauna do nosso planeta de forma satisfatória.
Qual a importância dos insetos para a fauna e flora brasileiras? A importância dos insetos pode ser medida pela sua riqueza no nosso país. Esses animais formam o grupo mais diverso do mundo, com o maior número de espécies. Isso ocorre também no Brasil, onde os insetos formam cerca de 70% das espécies animais. Por serem pequenos, eles frequentemente servem de alimento para répteis, peixes, anfíbios (como sapos e pererecas), aves e mamíferos, sendo fonte de proteína para animais que muitas vezes viram comida para nós.
Por exemplo, existem muitos peixes que se alimentam apenas de insetos que, posteriormente, vão para o prato do ser humano. Se exterminássemos os insetos, estaríamos exterminando muitos outros organismos, que morreriam de fome sem a sua presença. Já para a flora, eles servem frequentemente como polinizadores ao visitarem flores e frutos, função também de grande importância para o ecossistema, já que esses frutos podem servir de alimento para outros animais.
Por que as pessoas tendem a ter um olhar negativo sobre insetos? Eu diria que esse olhar advém de animais como pernilongos ou outros hematófogos (animais que se alimentam de sangue) ou baratas. Mas, se colocarmos na balança geral, a quantidade de insetos maléficos é muito menor que a dos benéficos. Olhando para baratas, as pessoas ficam horrorizadas; olhando para borboletas, ficam maravilhadas. A grande maioria dos insetos é útil e dócil no Brasil.
O que é o Catálogo Taxonômico da Fauna do Brasil? Essa é uma iniciativa de que tenho muito orgulho de participar e de ser um dos organizadores. Até 2015, o que existiam eram projeções de quantos animais diferentes existem no Brasil. A partir do catálogo, que é um esforço conjunto de centenas de zoólogos brasileiros, temos uma visão muito mais sólida da fauna brasileira. O catálogo é de extrema importância tanto para cientistas quanto para políticos e tomadores de decisões, pois diz e informa acerca de quais espécies ocorrem no nosso país.
Quantas espécies o catálogo conseguiu contabilizar até agora? Estamos próximos às 128 mil espécies no Brasil, coisa que antes não passava de estimativa. O Brasil hoje se destaca a nível mundial, porque é um dos poucos que conta com uma catalogação pública e acessível de sua fauna, o que é um mérito da zoologia brasileira.
O que falta para o público brasileiro se aproximar mais das ciências? No meu ponto de vista, essa distância entre o público brasileiro e as ciências já foi muito maior. As políticas adotadas mais recentemente, com o incentivo de bolsas e iniciações científicas desde o segundo grau, têm aproximado um pouco mais as pessoas da ciência. Evidente que, quanto mais incentivo os políticos proporcionarem, maior será essa proximidade. Eventualmente, essa aproximação pode ser cada vez mais natural e saudável.